segunda-feira, 3 de agosto de 2009

Em ritmo de Gafieira

A ironia da vida sempre acontece. Disso eu sei, mas às vezes ela acontece quando e da forma que menos se espera. Em 2004 me caiu nas mãos uma tal de Revista Zero [ ]. Era a edição #4, que tinha o Sepultura na capa e uma chamada que despertou minha atenção: “Ryan Adams enche a cara, liga pra redação e pede um emprego”. Quando bati o olho nela já pensei “opa!, faltou um ‘B’ aqui antes do nome do cara”, achando que eles estariam fazendo referência ao Bryan Adams. Ledo engano.
Realmente existia (e ainda existe!) um cara chamado Ryan Adams. Lendo a entrevista feita com ele, comecei a ficar atento ao trabalho do cara. O texto falava em Alt. Country, relacionamentos tortuosos, música folk e do processo de composição dele. Fiquei interessado e fui conferir o tal álbum daquele filho bastardo do Bob Dylan. Depois de virar fã confesso da obra dele, vi que não era só a música em si que havia me chamado pra conhecer, mas o texto do cara que havia feito a entrevista. Era, visivelmente, escrito por alguém apaixonado pelo que fazia. Esse tal alguém era o Alexandre Petillo.
Após perceber qual era o processo da coisa (artista bacana com matéria bacana gera reconhecimento do público com ambas as causas) fui atrás de mais textos do tal jornalista. Foi aí que começa minha saga com o Gafieiras.
A questão é que o site tinha um staff de colunistas com ótimas reflexões e uma escrita que me fazia querer devorar de uma vez toda aquela quantidade de texto. Aí começou a cair a minha ficha que eu não queria somente ler aqueles caras, mas queria escrever como eles. Na sessão de Colunas do site, todos me chamaram a atenção, mas em especial o Alexandre Matias e o Sérgio Seabra. O jeito do primeiro comentar discos, que iam desde detalhes aos valores artísticos presentes em cada álbum, e a crônica/prosa/poesia do segundo, era o que mais me chamava atenção neles.
Muito bem, passados alguns anos, entrei na faculdade de jornalismo – ação que atribuo uma parte da culpa aos caras que li – e, no terceiro ano de curso, após passar pelo processo seletivo do SESC, consegui enfim o sonhado estágio. Tudo estava muito bem, até que um dia navegando pelo meu roteiro de sites sobre cultura (que ainda vou postar aqui) resolvi entrar no Gafieiras novamente. Minha surpresa foi grande ao perceber que o tal de Sérgio Seabra do Gafieiras era o coordenador da programação de atividades do SESC em que faço estágio.
Após me identificar pra ele como leitor da coluna, por meio de um simpático "mas como você não me disse antes que era o Seabra do Gafieiras?”, comecei a interrogá-lo sobre o trabalho dele no site e sobre quais outros já havia feito.
Ainda bem que o Sérigo Seabra é uma pessoa paciente e receptiva, porque passei o endereço do blog pra ele dar uma olhada e consequentemente uns toques sobre o que deveria melhorar no meu texto. No dia seguinte fiquei sabendo que o Seabra havia indicado meu nome (e mostrado o blog) para o Ricardo Tacioli, idealizador do Gafieiras. Minha cara foi ao chão. Eu fiquei sem saber se agradecia ou se dizia a ele que eu não estaria à altura do site. Passado o dramalhão de estagiário, em questão de um dia acabei conhecendo o twitter do Gafieiras e em um dos posts descobri que havia a possibilidade de se participar do CincoPraUma , uma coluna fixa e aberta à participação de colaboradores. Aquela foi a deixa. Mandei a direct message pro perfil. Hoje minha seleção feita para a coluna já está no ar!
É óbvio que poder conviver com uma sumidade e ainda ter a chance de colaborar com o Gafieiras é para mim parte da realização de um sonho de moleque aspirante a jornalista que eu era em 2005/6 e que ainda continua louco pra aprender a escrever como gente grande.
Meu CincoPraUma aqui.

Ócio

Agindo como se eu já não tivesse muita coisa para fazer - o que não necessariamente caracteriza o ato de vagabundear- , descobri um site com ferramentas bacanas para desenhar on line. Na minha sessão "teu passado te condena" consta um ano de curso de artes plásticas, que eu deixei fugindo pela porta dos fundos e com medo dos academicismos. Apesar dos pesares, fica difícil não ter a sessão nostalgia quando encontro um lápis e um papel canson, como é o caso da prancheta virtual no Odosketch.

O mais legal de clicar no link pro desenho é que mostra o passo-a-passo da realização dele, desde os primeiros traços, até mesmo os que foram apagados em alguma etapa. Com isso, eu perdi uma meia hora destinada para fazer coisas mais úteis e também o medo de desenhar com o mouse. Ah! também percebi que o ócio é necessário para a vida. E muito.

Clique na imagem para ver o desenho no site.

Personagem ímpar na história da imprensa nacional, Renan Antunes de Oliveira é o calo no sapato de muita gente. Com um Prêmio Esso no currículo, ele trabalhou em meio mundo de veículos e não satisfeito com isso, chutou boa parte deles em nome de independência (se você fez cara de “isso existe?”, então somos dois).
Independentemente de eu concordar ou não com esse lance de ser livre pra dizer o que quiser no mundo da “liberdade de empresa”, como diria Clóvis Rossi, nem sobre pensamentos esquerdistas tão totalitários quanto os de direita, Antunes é um cara que sabe onde pisa e mesmo agindo com o pensamento de esquerda, tem a consciência de admitir o que acontece para poder criticar o cenário composto pela imprensa nacional.
Mais que um bom crítico, ele conhece a estrutura, dá a cara a tapa e deveria figurar entre os grandes nomes da imprensa (sim, aqueles tidos como mestres nas universidades), pois pensa o jornalismo de um modo que poucos se atrevem à fazê-lo. Seguem abaixo alguns trechos de uma entrevista feita com ele pelo site Fazendo Media:


RENAN ANTUNES DE OLIVEIRA

Vencedor do prêmio Esso de
Reportagem.

Breno Costa – Você trabalhou na Veja, na Istoé, no
Estadão. Você sempre teve essa postura combativa?

A postura combativa é até
um elogio desnecessário a essa altura do campeonato. Não é isso. É crítica o que eu quero dizer. Por exemplo, eu fui trabalhar na Veja na época em que se fez aquela campanha do Collor. Então, eu entrei para cobrir aquela campanha, era um dos repórteres de Política...


Mariana Vidal – Quanto tempo você
trabalhou lá?

Eu tinha 40 anos quando eu estava na Veja. Aí eu cheguei e fui trabalhar lá e vi todo mundo, gente como vocês, novos, recém-formados e entrando, trabalhando, tal... E a empresa mesmo trabalhando a favor do Collor.

Breno Costa – E a Redação era contrária a Collor?
Os jornalistas sempre têm esse discurso de esquerda. No discurso. Na prática, todo
mundo quer viver bem. Os jornalistas têm esse discurso crítico, mas quando ganham bem, eles dão o discurso no bar, mas chega na redação, na hora de escrever, se o patrão mandar mudar eles mudam. Aí vem a coluna vertebral dessa profissão. "É como dupla caipira: se você pagar eles tocam", frase do Ricardo Kotscho. Se você pagar um jornalista e disser para ele: "Olha, me escreve aqui a história do Che Guevara". Se te pagar, tu vai lá e escreve. Aí você volta dizendo que o Che era um revolucionário, etc. Mas o patrão: "Não gostei. O Che era veado". Aí você vai lá: "O Che, com suas relações homossexuais....". A Veja faz assim, entendeu? O cara escreve e prova a tese de que o Che era veado, se eles quiserem!


Breno Costa – Voltando à Veja, ela tem uma diferença marcante em relação a outras revistas semanais. Inclusive, no meio jornalístico, ela é bastante criticada. Eu queria saber qual é essa diferença e como isso se dá.
Gente, se vocês querem ser jornalistas na vida, esqueçam qualquer modelo já visto e olhado. A gente, quando está na faculdade, quer visitar tal jornal e tem gente que vai lá e faz um estagiozinho. Claro que a gente tem que ver, tem que saber, mas leiam os jornais velhos, peguem uma Veja velha e dêem uma lida e tirem suas conclusões. Então, eu não queria trabalhar, o troço não funcionava e eu comecei a mandar um freela para revista, pro Estadão... E aí fiz tudo sozinho! Aí me dirão: talvez por isso sua carreira tenha sido um fracasso, que tu tenha chegado aos 55 pra ganhar um miserável Prêmio Esso, enquanto qualquer outro recém-saído da faculdade, trabalha 20 anos na Folha, no Globo e ficam ricos. Os caras ficam ricos! Ricos! Ganham muito dinheiro. O salário de editor dá 10, 12, 15 paus. A única coisa que ele tem que fazer é não apertar muito, se não estraga as bolas do Dr. Roberto e ele não pode ser mais o garanhão que ele é! Quando eu trabalhei na Veja eu tive que dizer para o Dr. Roberto [Civita], a um palmo de distância, o que eu achava disso e daquilo.

Breno Costa – E uma das justificativas que as redações apresentam pra não fazer esse tipo de reportagem é o custo dessas matérias...
Gastei R$ 140,00 para fazer a matéria do Esso. A de Curitiba, estava no caminho, gastei só a passagem. Aí com o dinheiro do Prêmio Esso [R$ 10 mil], gastei quase R$ 7 mil para ir a Paris investigar um caso que aconteceu com um carioca.

Marcelo Salles – A matéria do Felipe Klein [vencedora do prêmio
Esso], você tentou vender pra revista Época, né?

É, eu liguei pro pessoal e
disse: "Olha, eu tenho essa matéria, tô te mandando". Porque eu queria voltar pra grande imprensa, ninguém quer ficar no gueto, num jornalzinho no Bom Fim [Bairro de Porto Alegre], embora ali seja onde eu posso escrever com independência. Não há pressão sobre um jornal pequeno, embora haja pressão dos grandes, que nos tiram das bancas. Ou vocês acham que isso não acontece? Se você botar um jornal pequeno nas bancas do Rio de Janeiro, alternativo, combativo, crítico e independente, O Globo vai lá, passa e diz: "O senhor está vendendo quanto desse jornal aí?" "Dez" "Pô, então faz o seguinte: não vou ocupar espaço na tua banca, me dá O Globo aqui". Tira 200 Globos dele. Aí o cara: "Não, não!" "Então, ou tu vende o meu ou tu vende o dele. Escolhe". É assim que funciona. Aí fica aquele monopólio da informação. A grande imprensa se especializou em "quem, onde, quando, como". "O João matou o Juca no dia 25, exatamente às 13h47". Eles dão aquela coisa certinho. "O governador disse isso". Aí abre aspas e põe uma frase. Agora, o porquê é que ninguém quer explicar. E eles [os grande jornais] sempre cospem para baixo. Eles não atacam em cima. É uma das primeiras coisas que um jornal te diz: "Olha, nós respeitamos as instituições, nós respeitamos as autoridades". Aí nesse caso das bancas, você vai no CADE [Conselho Administrativo de Defesa Econômica] se queixar. No outro dia, sai uma matéria no Globo, primeira página: "Corrupção no CADE. Cinco conselheiros estão sendo investigados". Aí já tira o caso, entendeu? Eles fazem isso. Tu não tem jornal pra publicar isso. A gente fala entre nós, você publica em um panfletinho, mas a grande mídia silencia sobre isso, fica quieta.



Confira a entrevista completa aqui.